A vida tem muitos significados, um mais metafísico e confuso que o outro, o que faz a pergunta do “sentido da vida” ter uma resposta difícil. Há pouco tempo, eu me fiz essa pergunta e não queria nada mais que uma resposta simples ou nem mesmo uma resposta, apenas um fato pequeno que fizesse sentido. Descobri esse fato: uma das emoções que mais dão sabor à existência, dando em parte o sentido da vida, é o prazer da descoberta. Caso confirmado por todos, mas há um grande problema nisso. Não sabemos dosar as descobertas: é necessário deixar perguntas sem respostas, é necessário ingenuidade para nos manter lúcidos.
Ingenuidade é algo que devemos cultivar em nossa trajetória, quando perdemos o “só sei que nada sei” temos um desfalque enorme no sentido de viver e apenas conseguimos manter isso com humildade e ingenuidade; agora, se tivermos dificuldade em aprender essas lições, podemos olhar para as crianças. Já se perguntou por que a infância é vista pelos adultos como a fase mais bonita que vivemos? Enxergamos assim porque as crianças são um poço de ingenuidade, elas têm o mundo inteiro para descobrir ainda, algo que nós, adultos, não temos mais e ficamos tristes por essa perda de prazer que o novo pode proporcionar.
Com a consciência de que o “novo” está acabando e de que o prazer da descoberta vai esvaindo-se, ficamos deprimidos. Em casos mais extremos, ficamos indiferentes pela vida em uma bola de neve niilista no fim da qual alguns enxergam o suicídio— caso retratado por Dostoiévski no conto “O sonho de um homem ridículo”.
O eu lírico do conto está prestes a suicidar-se pela indiferença da vida, mas uma criança o para na rua pedindo ajuda, acontecimento que culmina em um sonho quando ele volta para sua casa e adormece. Esse sonho o salva, pois, na minha visão interpretativa, o sonho devolve as perguntas da ingenuidade.
Ele é um sujeito que não sente mais nada pela vida, mas, em seu sonho, é levado por uma criatura divina a um mundo perfeito, sem pecado, repleto de amor e, após isso, fala que conheceu a verdade. No fim, mesmo que o personagem tenha destruído esse planeta e acabado com o amor coletivo infiltrando o “pecado original”, ele acorda querendo transmitir o que viveu, falar sua verdade e tentar achar uma lógica para o paraíso que aquela Terra vivia com aquela quantidade imensa de amor. Isso devolveu-lhe a gana de viver, pois trouxe-lhe a ingenuidade da pergunta sem resposta e a expectativa do prazer da descoberta de novo, além do ânimo de pregar aos homens da Terra original o que viveu com aqueles habitantes do “paraíso”.
Precisamos investir na ingenuidade, nem sempre o conhecimento completo é totalmente bom. Devemos manter áreas desconhecidas, mesmo que sejamos chamados de ridículos por isso. Dessa forma, cultivamos um caminho a seguir e é pela ingenuidade que queremos algumas coisas e temos fé em outras, como uma vez explicitou o grande ator José Wilker.
Lembre-se de quando era criança, o Natal tinha uma magia única que foi embora depois da descoberta de que o Papai Noel não existe e hoje o Natal é um tanto sem graça por causa disso. Clarice Lispector já dizia “Aquilo que eu não sei é minha melhor parte”, mais um argumento para deixarmos algumas coisas de lado agora para que no futuro ainda tenhamos o prazer da descoberta vivo. Pense nisso e veja a importância da ingenuidade em nossas vidas.
Imagem por Abyss - Alpha Coders
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